Summary: | Foi realizada a investigação cladística dos Bouchardiinae (Brachiopoda, Terebratellidae), braquiópodes comuns no registro fóssil cenozóico da Argentina, Uruguai, Antártica, Nova Zelândia e Austrália, bem como, atualmente, na plataforma brasileira. A história geológica do grupo remete ao limite Cretáceo/Terciário. O estudo teve como objetivo central demonstrar que a análise das feições morfológicas internas e externas de conchas fósseis e atuais de braquiópodes possibilita a realização de estudos cladísticos. Para atingir esse objetivo foram avaliadas as relações de parentesco e a sistemática dos Bouchardiinae (Família Terebratellidae), bem como o escopo de seus gêneros. A análise envolveu os gêneros Bouchardia, Bouchardiella, Neobouchardia e Malleia, tendo como grupo externo Adnatida, Aliquantula, Anakinetica, Australiarcula, Elderra, Magadina, Magadinella, Parakinetica, Pilkena, Pirothyris e Rhizothyris. A análise contou com 22 táxons (grupo interno e externo) e 43 caracteres. O cladograma (CI= 0,714; RI= 0889; RC= 0,635) escolhido como proposta de trabalho apresentou topologia bem resolvida, com dois clados bem distintos. Um deles, reúne todos os Bouchardiinae, tendo Malleia portlandica como táxon basal, o outro agrupa os Anakineticinae, incluindo Australiarcula artesiana. Entre os Bouchardiinae, a única indefinição ficou por conta das espécies Bouchardia rosea e Bouchardia transplatina, o que reforça a suspeita de serem sinônimos. Entre os táxons do grupo externo destaca-se a posição basal de Australiarcula artesiana. Os resultados obtidos permitiram considerar que: a) a análise morfológica interna e externa de conchas de braquiópodes fósseis e viventes fornece dados morfológicos adequados à análise cladística; b) existem 2 clados distintos no cladograma escolhido como hipótese de trabalho, um representativo dos Bouchardiinae e outro dos Anakineticinae, incluindo Australiarcula artesiana, o que esclarece, de momento, a dúvida quanto a posição desse gênero; c) a condição dos táxons enquanto gêneros válidos e distintos foi reavaliada e foi proposta a sinonímia entre Bouchardiella e Neobouchardia, em favor da primeira; d) Bouchardia rosea e Bouchardia transplatina não apresentaram diferenças morfológicas significativas e, somando-se a isso, sua posição na topologia obtida sugere sinonímia entre os táxons, em favor de Bouchardia rósea (Mawe), 1823; e) o monofiletismo dos Bouchardiinae foi corroborado; f) foram confirmadas as 3 sinapomorfias já sugeridas pela literatura, isto é, espessamento posterior, processo cardinal em forma de \'V\' e braquídio incompleto; g) a topologia obtida suporta a sugestão de que Bouchardia rosea e Anakinetica cumingi apresentam morfologia semelhante por compartilharem modos de vida similares e não por parentesco próximo; h) a proposta de classificação mais adequada para os Bouchardiinae parece combinar opiniões de RICHARDSON (1994) e BRUNTON(1996), tornando válida a Subfamília Bouchardiinae, composta por Bouchardia, Bouchardiella e Malleia; i) a despeito da falta do registro estratigráfico de parte da história evolutiva dos Bouchardiinae, foi identificada a evolução em paralelo de dois grupos, um deles, de duração mais curta e restrito à Austrália e Nova Zelândia, formado por Bouchardiella cretacea, Bouchardiella (Neobouchardia) minima e Malleia portlandica, e outro, formado por Bouchardiella patagonica, Bouchardiella jorgensis e as espécies de Bouchardia, persistindo até o Recente, tendo se desenvolvido entre a Península Antártica e a costa leste da América do Sul; j) além do padrão geral de migração das espécies de Bouchardia para o norte, foram identificados alguns passos intermediários nesse modelo, principalmente quanto à migração de Bouchardia da Terra do Fogo (Argentina) para a Península Antártica; assim, o modelo de \"contínua migração das espécies para o norte, sem retenção de suas localidades prévias\" estaria parcialmente descartado, não invalidando, contudo, o padrão geral de migração para o norte. === A cladistic investigation of Bouchardiinae (Brachiopoda, Terebratellidae) was carried out. These brachiopods are common in the Cenozoic fossil record of Argentina, Uruguay, Antarctica, New Zealand, Australia, as well as in the Brazilian shelf. The geological history of the group can be tracked back until de Cretaceous/Tertiary boundary. The main goal of present study was to verify the hypothesis that morphological analysis on internal/external features of extinct/extant brachiopod shells allow us to proceed a cladistics analysis for the group. In order to achieve this goal, the relationships and systematic of the Bouchardiinae (Family Terebratellidae) were evaluated, as well as the scope of their genera. The cladistics analysis involved the in-group taxa Bouchardia, Bouchardiella, Beobouchardia, Malleia, having Adnatida, Aliquantula, Anakinetica, Australiarcula, elderra, Magadina, Magadinella, Parakinetica, Pilkena, Pirothyris, Rhizothyris, as the out-group. A total of 22 taxa and 43 characters were evaluated. The cladogram used as work hypothesis (CI= 0,714; RI= 0,889; RC= 0,635) presented a well resolved topology with 2 distinct clades; one with all Bouchardiinae, being Malleia portlandica the basal taxon; the other presented all Anakineticinae, including Australiarcula artesiana. The only unresolved relationship was between Bouchardia rosea and Bouchardia transplatina, suggesting that both taxa are synonymous. Among the out-group taxa the basal position of Australiarcula artesiana is worthy to mention. The results allow us to consider that: a) the morphological analysis of internal/external features of extinct/extant brachiopod shells supply important morphological data for cladistics analysis; b) there are 2 distinct clades that are representative of the Bouchardiinae and Anakineticinae, the later including Australiarcula artersiana, bringing some new evidences on their systematic position; c) the status of the genera, while valid and distinct taxa was re-evaluated, and resulted on the proposition of the synonymy between Bouchardiella and Neobouchardia, favoring the former; d) Bouchardia rosea and Bouchardia transplatina did not share significant morphological differences to keep them as distinct taxa. Thus the synonymy in favor of Bouchardia rosea (Mawe), 1823 is proposed; e) the monophyletic status of Bouchardiinae was corroborated; f) 3 synapomorphies ever suggested by the literature were confirmed, as follow: posterior thickening of the shell, \"V\" shapped cardinal process, and incomplete brachidia; g) based on the topology the condition of Bouchardia rosea and Anakinetica cumingi as distinct taxa is reinforced. Thus, their morphological similarities are much more due to similar ecological pressures (or mode of life) than to their close relationships; h) the classification of bouchardiid brachiopods seems to combine the suggestions of RICHARDSON (1994) and BRUNTON (1996), validating the Subfamily Bouchardiinae, with Bouchardia, Bouchardiella, and Malleia; i) despite of the lack of stratigraphic record of part of bouchardiid history, the parallel evolution of 2 groups was identified; one presenting a short interval, restricted to Australia e New Zealand, and corresponding to Bouchardiella cretacea, Bouchardiella (Neobouchardia) minima e Malleia portlandica, and the other group corresponding to Bouchardiella patagonica, Bouchardiella jorgensis, and species of Bouchardia, with an almost continuous record since the Cretaceous. This group evolved around the Antarctic Peninsula and east coast of southern South America; j) in spite the general north migration pattern presented by species of Bouchardia, some intermediate steps could be recognized, specially the migration of Bouchardia towards the Tierra del Fuego coast (Argentina) and Antarctic Peninsula. Consequently, the previous pattern of continuous northward migration of bouchardiid species without the retention of previous locations is only partially supported by the current data.
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