Summary: | Este estudo foi realizado com o uso do discurso construcionista social. De acordo com este discurso, a construção de sentidos sobre o mundo e sobre o homem se dá através da linguagem, nos relacionamentos. As construções são também circunscritas ao contexto histórico e cultural. A linguagem está institucionalizada através de discursos que produzem determinados efeitos, construindo modos de ser e de agir no mundo. No campo de estudos de álcool e outras drogas temos diversos discursos que regulamentam o consumo destas substâncias. O discurso construcionista social nos convida a problematizar estes discursos, assumindo postura crítica frente a eles. A literatura científica apresenta diversos discursos que auxiliam a construir sentido sobre o consumo de bebidas alcoólicas por mulheres. São destacados aqui os discursos epidemiológicos, biomédico, sociológico e psicológico, refletindo sobre efeitos destes discursos. Deste modo, o objetivo deste estudo foi fazer uma aproximação do discurso construcionista social para o campo de estudos do consumo de bebidas alcoólicas por mulheres, mais especificadamente, problematizar o vocabulário disponível na área para a significação das situações referentes ao uso de álcool; analisar as implicações identitárias dos discursos tradicionais da área; produzir interpretações alternativas relativas às questões de uso do álcool (individual e social). O estudo foi realizado em um serviço ambulatorial para tratamento de farmacodependências. Participaram do estudo duas mulheres que fizeram tratamento neste serviço, recebendo diagnóstico de síndrome de dependência de álcool (Miriam e Ana). Os instrumentos utilizados foram caderno de campo e entrevista de história de vida. A análise foi realizada em dois momentos: 1. Imersão no caderno de campo, onde foram identificados discursos, vozes e posicionamentos; 2. Imersão nas entrevistas, onde foi utilizada a ferramenta da análise do discurso, identificando discursos e efeitos destes para construção de versões identitárias e de práticas sociais. Na conversa com Miriam, construímos uma narrativa saturada pelo problema. Com o uso de alguns discursos (ex. papéis sociais de gênero, psiquiátrico, motivação interna) a versão construída da história de Miriam é a de alguém que está impotente frente ao consumo. Na conversa com Ana, construímos uma narrativa de sucesso. Com o uso de alguns discursos (ex. papéis sociais de gênero, autonomia) a versão construída da história de Ana é de alguém que não tem problema com o consumo de bebidas. Entretanto, este posicionamento é colocado em questão pelas vozes dos filhos. A partir de relatos de exceção, são oferecidas histórias alternativas às histórias dominantes. Os discursos produzem diferentes efeitos que só podem ser conhecidos com seu uso. É no relacionamento que os sentidos são construídos e que se abrem as possibilidades de mudança. A postura flexível, responsiva e de co-responsabilidade é sugerida para a abordagem da questão do consumo de bebidas alcoólicas por mulheres, considerando, nos relacionamentos, quais discursos possibilitam a construção de uma relação de ajuda. === This study was carried out with the use of the social constructionist discourse. According to this discourse, the construction of meaning about the world and the being is through language in relationships. Constructions are also constrained by the historical and cultural context. Language is institutionalized through discourses that produce certain effects, constructing ways of being and acting in the world. In the field of study of alcohol and other drugs there are several discourses that regulate the use of these substances. The social constructionist discourse invites us to question these discourses, taking a critical stance towards them. The scientific literature presents several discourses that help to construct meaning about the consumption of alcohol by women. The epidemiological, biomedical, sociological and psychological discourses are highlighted here, reflecting on the effects of these discourses. Thus, the objective of this study was to bring the social constructionist discourse to the field of study of alcohol consumption by women, more specifically, to question the available vocabulary in the area used to make meanings of the situations regarding alcohol use; to analyze the identity implications of the traditional discourses in the area; to produce alternative interpretations concerning the issues of alcohol use (individual and social). The study was conducted in an outpatient clinic for substance abuse treatment and included two women who were treated in this service and had received diagnoses of alcohol dependence syndrome (Miriam and Ana). The instruments used were a field notebook and life story interview. The analysis was conducted in two parts: 1. Immersion in the field notebook, which identified discourses, voices and positioning; 2. Immersion in interviews, where discourse analysis was used, identifying discourses and the effects of these to construct versions of identity and social practices. In conversation with Miriam, we constructed a problem saturated narrative. With the use of some discourses (e.g. social roles of gender, psychiatric, internal motivation) a version of the story of Miriam as someone who is powerless against alcohol consumption was constructed. In conversation with Ana, we constructed a narrative of success. With the use of certain discourses (e.g. gender roles, autonomy) the version constructed of Anas story is of someone who has no problem with drinking. However, this position is questioned by the voices of her children. From the reports of exception, alternative stories to the dominant stories are offered. Discourses produce different effects that can only be known through their use. It is in the relationship that the meanings are constructed and possibilities for change open up. A flexible, responsive and co-responsible approach is suggested to address the issue of alcohol consumption by women, considering, within the relationship, which discourses enable the construction of a therapeutic relationship.
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