Summary: | Um dos maiores desafios das sociedades ocidentais é também uma das suas maiores
conquistas: o envelhecimento demográfico. A longevidades conquistada pela melhoria das
condições de vida leva a que muitas pessoas com mais de 65 anos vivam longe das suas famílias
e afastadas da vida comunitária, decorrente de fatores como não contribuírem economicamente
para a sociedade, perderem autonomia e o preconceito contra a sua idade (idadismo). O
confinamento e outras medidas associadas à pandemia COVID-19 tiveram impacto nas
dinâmicas de solidariedade intergeracional familiar e sentido de comunidade. Este estudo teve
como objetivo explorar o modo como estas duas variáveis influenciam a perceção da qualidade
de vida. Para o efeito, foram realizadas 17 entrevistas semiestruturadas a dez pessoas idosas
participantes de uma associação sem fins lucrativos sedeada num bairro de habitação social e
sete dos/as seus/suas familiares (filhos/as e netos/as). O material recolhido foi submetido a
análise de conteúdo, tendo emergido as seguintes categorias: solidariedade intergeracional
familiar com a presença de quase todas as dimensões de Bengtson exceto o conflito; sentido de
comunidade onde são relatados os anos de vivência na atual habitação, as redes de relações de
amizade e vizinhança, ajuda institucional, quantidade e proximidade de serviços na
comunidade, envelhecimento ativo; qualidade de vida descrita a partir das condições
habitacionais, saúde (física e mental), idadismo, motivos económicos. Ao longo da descrição
das categorias são dados exemplos concretos do impacto que a COVID-19 teve nas mesmas.
Parece existir consenso entre pessoas idosas e seus/suas familiares quanto à importância
da solidariedade intergeracional familiar, em particular no enfrentamento da COVID-19. As
restrições sanitárias impostas suspenderam algumas manifestações de solidariedade
intergeracional, como as atividades em conjunto, as visitas, as expressões de afeto ou a troca
de apoio e de cuidados instrumentais. Contudo, não pareceram ter sido suficientes para uma
perceção de diminuição de disponibilidade de apoio por parte da família, parecendo ter sido os
seus efeitos menos positivos na solidariedade intergeracional não familiar. Contudo, a
residência num bairro de habitação social parece ser visto como fator promotor do sentido de
comunidade, tanto por parte das pessoas idosas, como dos/as seus familiares. Ainda que
existam limitações apontadas pelas pessoas idosas e, sobretudo, pelos/as seus/suas familiares,
como é o caso de alguma perigosidade ou ruído provocado por alguns elementos da vizinhança,
ou a precariedade ou falta de adaptação das habitações, a residência no bairro parece
proporcionar coerência na narrativa do ciclo de vida e continuidade nas redes de suporte. Deste
modo, o sentido de comunidade e seu efeito positivo sobre a qualidade de vida parece ser
vivenciado pelas pessoas idosas que participaram neste estudo. Algumas sugestões e
implicações para estudos futuros e para a intervenção serão discutidas.
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