Summary: | O Estado, para obter recursos com o objetivo de financiar suas atividades, recorre ao mercado por meio de dois mecanismos: a obtenção de empréstimos individualizados e o lançamento de títulos públicos. Na realidade atual, a dívida mobiliária alcança volume muito superior ao da contratual, tendo em vista algumas vantagens do mecanismo dos títulos públicos. Entre essas vantagens, pode-se citar um universo maior de potenciais compradores, a possibilidade de execução de política monetária, a maior facilidade de controle, o menor custo de negociação e escrituração. Fenômeno também observado nas últimas décadas, em escala mundial, é de que os títulos públicos sejam emitidos de modo escritural e eletrônico. Nesse contexto, não pode ser aplicado a esses valores o ferramental teórico e normativo dos títulos de crédito. Com efeito, se a doutrina tradicional considerava os papéis emitidos pelo Estado como uma espécie desses títulos, tal constatação não mais se sustenta, em especial diante da completa inexistência de um suporte documental dos ativos eletrônicos. As características e institutos próprios dos títulos de crédito, como a cartularidade, a literalidade, o endosso e o aval não são compatíveis com a realidade negocial que hoje conforma os títulos públicos. Um conceito jurídico que pode explicar a natureza atual dos títulos públicos e permitir o regramento das operações que os envolvem é o de instrumento financeiro. Desenvolvido no âmbito do ordenamento comunitário europeu, esse conceito não se encontra perfeitamente delimitado no ordenamento jurídico brasileiro, mas nada impede a sua construção em sede doutrinária. Tomando por base a noção de instrumento financeiro, o foco da normatização deixa de ser cada título considerado em si, para recair sobre o mercado em que eles são negociados. Assim, ganha relevo o estudo da estrutura institucional desses mercados, bem como das principais operações que neles são travadas. Tais operações incluem a emissão e a oferta inicial, a negociação secundária, o resgate, a rolagem da dívida, bem como eventuais renegociações e alterações unilaterais nas características dos títulos. Para o desenvolvimento de mercados líquidos e eficientes, algumas condições são imprescindíveis, como, por exemplo, a existência de graus mínimos de estabilidade, previsibilidade e segurança, de uma imagem sólida e confiabilidade das instituições participantes, em especial dos entes estatais emissores etc. Além disso, todo o arcabouço normativo deve ser construído levando-se em consideração os interesses de cada grupo de agentes econômicos envolvidos, como forma de tornar atrativa para estes a alocação de recursos na aquisição de títulos públicos.
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When the State needs to obtain resources in order to finance its activities, it resorts to the market through two main mechanisms: individual loans or public securities. Nowadays, the debt securities total amount is much higher compared to the debts founded on individual loans, due to some advantages of the technology of public securities. Among such advantages, it can be mentioned a larger universe of potential buyers, the possibility of implementing monetary policy, the easier control, and the lower costs of trading and bookkeeping. In recent decades, it has also been noticed that the public bonds are worldwidely issued in both book-entry and electronic ways. In this context, the theoretical and normative tools regarding negotiable instruments can not be applied to these bonds anymore. Indeed, if the traditional doctrine used to consider the public bonds as negotiable instruments, such understanding can no longer take place, specially taking into account the complete absence of any supporting documentation of electronic assets. The peculiar characteristics and rules related to the negotiable instruments, such as the need of the document to enforce the rights, the respect to the terms of the document, the endorsement, and the guaranty are no longer compatible with the present reality of public bonds. A legal concept that can explain the current nature of the public securities and allows the regulation of operations envolving them is the financial instrument. Developed under the European Community law, this concept is not well defined in the Brazilian legal system yet, but nothing prevents its development in our doctrine. Based on the concept of financial instruments, the focus of regulation is no longer each title considered itself, but the markets in which the financial instruments are traded. Thus it becomes important to study the institutional structure of such markets, as well as the leading operations that are performed in the markets scope. Such operations include the issuance and the initial offering, the secondary trading, the redemption, the debt rollover, the renegotiations of the bonds, and the unilateral changes of their characteristcs. In order to develop efficient and liquid markets, certain conditions are essential, such as the existence of minimal degrees of stability, predictability and security; a solid image and reliability of the participating institutions, in particular of the public issuing bodies etc. Moreover, any regulatory framework should be built taking into consideration the interests of each economic agents groups involved, in order to make the allocation of resources in government securities attractive for them.
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