Depois do temporal: um estudo psicodinâmico sobre a criança enlutada e seus pais

Em todo o ser humano existe uma condição inata a desenvolver-se; no entanto, as condições externas podem dificultar que esse processo ocorra bem. Assim, para que um desenvolvimento emocional saudável aconteça, é necessário que exista um meio suficientemente bom, capaz de oferecer holding, para p...

Full description

Bibliographic Details
Main Author: Marcela Lança de Andrade
Other Authors: Valeria Barbieri
Language:Portuguese
Published: Universidade de São Paulo 2013
Subjects:
Online Access:http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/59/59137/tde-12022014-084235/
Description
Summary:Em todo o ser humano existe uma condição inata a desenvolver-se; no entanto, as condições externas podem dificultar que esse processo ocorra bem. Assim, para que um desenvolvimento emocional saudável aconteça, é necessário que exista um meio suficientemente bom, capaz de oferecer holding, para permitir a expressão espontânea e criativa da criança no mundo. Um dos acontecimentos que mobiliza intensamente as pessoas e que é passível de comprometer o seu bem-estar, é a morte de um ente querido. Para a criança que está em desenvolvimento, esse evento é ainda mais significativo, pois as angústias e tristezas surgidas no processo de luto podem refletir no desenvolvimento emocional, em especial quando a sua família sofreu o processo de perda de um filho. O luto dos pais pode influenciar no desenvolvimento emocional da criança e no modo como se processará o luto desta. Sendo assim, o presente estudo, por meio de uma metodologia clínica-qualitativa, objetivou analisar a vivência da criança que perdeu um irmão, e a repercussão dessa perda no seu desenvolvimento emocional conforme relacionada ao luto dos pais. Os participantes foram três famílias que perderam um filho por uma patologia e que tinham outro filho criança vivo. Os instrumentos utilizados foram entrevista e a aplicação do Procedimento de Desenhos de Famílias com Estórias (DF-E) com os pais, e o Teste da Casa-Árvore-Pessoa (HTP) e Teste das Fábulas com a criança, a fim de avaliar os seus psicodinamismos, bem como a estrutura familiar conforme influenciada pelo luto. Os resultados foram analisados sob uma perspectiva psicanalítica winnicottiana, por meio do método da livre inspeção do material, acrescido de contribuições contidas nos manuais do HTP e do Teste das Fábulas. Os resultados demonstraram que o trabalho de luto desenvolvido pelos pais influencia no modo como as crianças prosseguem com o seu luto e com seu desenvolvimento emocional. A perda de um irmão, em especial, desperta os sentimentos de rivalidade fraterna, o que problematiza a relação com o luto. As consequências das perdas inibem o viver criativo e espontâneo e obrigam a utilização de defesas para que seja possível continuar a viver. Os pais não conseguem atender as necessidades dos seus filhos e oferecer holding a eles, pois os sentimentos derivados das perdas inibem a sua capacidade criativa. Como consequência, eles não podem se adaptar à criatividade dos seus filhos e, assim, as crianças não conseguem ser espontâneas. Desse modo, existe um prejuízo na área da transicionalidade para ambos. Por meio do uso da criatividade, é possível viver a realidade externa, por mais dura que ela seja, proporcionando maneiras de lidar com as dificuldades e permitindo a expressão do verdadeiro self. A criatividade é, então, essencial para a elaboração do luto, por isso, se a capacidade de criar nos pais e nos filhos estiver comprometida, resta a eles negar os sentimentos derivados da experiência da perda de um ente querido. Assim, diante da dificuldade de se expressar e criar, os sentimentos derivados das perdas, nessas famílias, foram negados ou evitados, e o desenvolvimento emocional das crianças foi, então, prejudicado. === There is an innate tendency to self-development in every human being; however the environment can hinder this development. Therefore, the good enough environment, which provides holding to render possible the creative spontaneous expression of children, is necessary for the existence of their emotional development. Losing a loved one is one of the events that most affect and threaten people\'s well-being. For a child, this event and the sorrow that comes in its train are even more influential in their emotional development, especially when their family loses another child. Parents in morning influence the way that children mourn and the emotional development of the latter. This study, by means of clinical-qualitative methodology, aimed at analyzing the experience of children who lost a sibling and the consequences of the loss for his or her development according to their parent\'s grief. The research participants were three families that lost a child on account of a disease, and had another living child. The instruments used were interviews and the application of the Procedure Drawings of Families with Stories - (DF-E) according to its acronym in Portuguese - in the parents, and the application of the House-Tree-Person (HTP) and the Test of Fables in the children, in order to assess their psychodynamics as well as the family structure influenced by grief. The results were analyzed from a psychoanalytic Winnicott perspective, by means of the method of free material inspection, in addition to contributions contained in the manuals of the HTP and the Test of Fables. The results showed that the work of mourning made by the parents influences the way the children come to terms with their grief and undergo their emotional development. The loss of a sibling arouses feelings of sibling rivalry, which complicate their relationship with mourning. The consequences of the losses inhibit spontaneous, creative living and require the use of psychological defense mechanisms so that the family members can continue to live. The parents cannot meet the needs of their children and provide them with holding, because the feelings derived from the losses hamper their creative ability. As a consequence, they cannot adapt to the creativity of their children, thus the latter do not succeed in being spontaneous. Therefore, both are harmed as to experiencing transitionality. By means of being creative, living the outside reality can be possible, however hard it may be, providing ways to deal with difficulties and allowing the expression of the true self. Therefore, creativity is essential for the grief process; if the parents\' and children\'s abilities to create are impaired, their only option is to deny the feelings derived from the experience of losing a loved one. Before the difficulty in expressing themselves and creating, the feelings derived from the losses, in these families, were denied and avoided, consequently, the children\'s emoemotional development was harmed.