Summary: | O termo de compromisso é um instrumento do Direito, previsto com um fim
específico no Decreto 4.340/2002, que regulamenta dispositivos da lei do Sistema Nacional
de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), para normatizar provisoriamente a relação
entre populações tradicionais residentes no interior de unidades de conservação (UCs) de
proteção integral, onde não são permitidos assentamentos humanos nem o uso direto de seus
recursos naturais. Como tal, é reflexo de um dos conflitos centrais à instituição Conservação
da biodiversidade: de um lado, os defensores do mito moderno da natureza intocada
(DIEGUES, 2004) e, do outro, do princípio da co-evolução, segundo o qual “todas as culturas
humanas têm alterado os ecossistemas há milênios, enquanto a natureza exerceu
simultaneamente pressões evolutivas sobre a biologia humana e os sistemas sociais”
(COLBY, 1992, p. 145 apud VIEIRA, 2001, p. 298). Neste trabalho, pensamos o Termo de
Compromisso como caminho para a inovação institucional da Conservação da biodiversidade,
analisando-o através da recente experiência de implantação do instrumento na Estação
Ecológica Serra Geral do Tocantins (EESGT), região do Jalapão, onde junto com outras UC
constitui a maior área protegida do Cerrado brasileiro (ICMBio/JICA, 2011). O conflito posto
pela sobreposição entre as UC de proteção integral e os territórios das populações tradicionais
no Jalapão levou a que estas se mobilizassem pelo reconhecimento de seus direitos e saberes.
Assumimos que o grande eixo estruturador do conflito é o manejo tradicional do fogo para as
atividades produtivas que ao mesmo tempo cumpre um papel ecológico importante, segundo
o saber local, mas que por muitos anos foi considerado criminoso pelos órgãos ambientais.
Nesse sentido, entendemos que a identidade quilombola construída pelas comunidades
“atingidas” por UC na região passa muito mais pela identificação com os modos de viver nos
gerais, como os locais se referem às grandes extensões de terra com baixíssima densidade
demográfica e abundância de recursos naturais, do que por relatos da escravidão. Através da
teoria dos recursos de uso comum (RUC) (OSTROM, 2011), que identifica princípios de
desenho constantes nos arranjos organizacionais em torno da gestão comunitária de recursos
naturais, buscamos reconstituir estes modos de viver nos gerais antes da chegada das UC,
através do método da história de vida (PORTELLI, 2001), que consiste em resgatar a história
não oficial através dos filtros da memória. Em seguida, descrevemos a sequência de ações
coletivas (OSTROM, 2010) acionadas pelo conflito UC x populações tradicionais do Jalapão,
a qual desaguou na mobilização pelo Termo de compromisso, sendo que a EESGT foi a única
UC a efetivamente implantar o instrumento, motivo pelo qual se tornou nosso estudo de caso.
A situação das duas comunidades inseridas em seu interior serão analisadas
comparativamente, de forma a identificarmos os desafios que o Termo de compromisso
suscita, uma vez que, em uma, o instrumento foi assinado enquanto na outra, vem sendo
rejeitado. Por fim, uma análise do texto do Termo de compromisso firmado à luz dos
princípios de desenho dos RUC de longa duração nos ajuda a responder à nossa pergunta
central. === The Term of Commitment is a law instrument provided with a specific aim by the Decree
4.340/2002, to regulate items of the National System of Conservation Units (NSCU) to
temporarily regulate the relationship between traditional communities residing within fully
protected conservation units (CUs), which do not allow human settlements nor the direct use
of natural resources. As such, it reflects one of the central conflicts to the institution of
Biodiversity Conservation: on the one hand, advocates of the modern myth of untouched
nature (DIEGUES, 2004) and on the other, of the principle of co-evolution, according to
which "all human cultures have changed ecosystems for millennia, while nature
simultaneously exerted evolutionary pressures on human biology and social systems" (Colby,
1992, p. 145apud Vieira, 2001, p. 298). In this work, we consider the Term of Commitment
as a way for institutional innovation of Biodiversity Conservation, analyzing it through the
recent deployment experience of the instrument in the Serra Geral do Tocantins Ecological
Station (EESGT), Jalapão region, where, along with other CUs, constitutes the largest
protected area in the Brazilian Cerrado (ICMBio/JICA, 2011). The conflict posed by the
overlap between the fully protected UC and the traditional communities’ territories in Jalapão
led these communities to mobilize for recognition of their rights and knowledge. We assume
that the major structural axis of the conflict is the traditional fire management for productive
activities, which, at the same time, plays an important ecological role, according to local
expertise, but that has been considered illegal for many years by environmental agencies. In
this sense, we believe that the quilombola identity built by the communities "affected" by CU
in the region has a lot more to do with the identification with the ways of living in the gerais,
(as the locals refer to large tracts of land with very low population density and abundance of
natural resources), than with the reports of slavery. Through the theory of common pool
resources (CPR) (OSTROM, 2011), which identifies design principles set out in the
organizational arrangements around the community management of natural resources, we
seek to reconstruct these ways of living in the gerais before the arrival of the CU through the
life history method (PORTELLI, 2001), which consists in rescuing the unofficial history
through the filter of memory. We then describe the sequence of collective action (Ostrom,
2010) triggered by the conflict between CU x Jalapão traditional populations, which resulted
in the mobilization for the term of commitment, and the EESGT was the only UC to
effectively deploy the instrument, and is the reason why it became our case study. The
situation of the two communities inside its boundaries will be analyzed comparatively in
order to identify the challenges that the Term of commitment raises, once the instrument has
been signed by one of the them while in the other, it has been rejected . Finally, an analysis of
the text of the agreement signed in light of the principles of design of the RUC long term
institutions helps us answer our central question.
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