Tratamento diferenciado dos países em desenvolvimento e mudanças climáticas : perspectivas a partir do acordo de Paris

O tratamento diferenciado dos países em desenvolvimento surge a partir da década de 70 como expressão de resistência dos países do então Terceiro Mundo a uma ordem mundial pós-guerra entendida essencialmente como injusta e cuja doutrina do desenvolvimento tal como prescrita não conseguia equalizar....

Full description

Bibliographic Details
Main Author: Oliveira, André Soares
Other Authors: Olivar Jimenez, Martha Lucia
Format: Others
Language:Portuguese
Published: 2017
Subjects:
Online Access:http://hdl.handle.net/10183/158919
Description
Summary:O tratamento diferenciado dos países em desenvolvimento surge a partir da década de 70 como expressão de resistência dos países do então Terceiro Mundo a uma ordem mundial pós-guerra entendida essencialmente como injusta e cuja doutrina do desenvolvimento tal como prescrita não conseguia equalizar. A partir de movimentações políticas, os países em desenvolvimento emplacaram tal tratamento no âmbito de importantes documentos internacionais e acordos multilaterais. O tratamento diferenciado dos países em desenvolvimento se expressa no direito internacional ambiental por meio do princípio das responsabilidades comuns mas diferenciadas e respectivas capacidades, consagrado da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, de 1992, e cuja expressão máxima é a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (CQMC). Tendo como objeto o tratamento diferenciado dos países em desenvolvimento, delimitado às obrigações centrais no âmbito da CQMC, a presente pesquisa encara o problema de sua operacionalização desde a mencionada Convenção até o seu Acordo de Paris. Para tanto, a pesquisa vale-se do método dedutivo, uma abordagem estruturalista e materialista-histórica para a análise de conteúdo dos textos jurídicos, observando a operacionalização do tratamento diferenciado em nas obrigações em termos de vinculatividade, precisão e delegação. O resultado foi que as mudanças climáticas são necessariamente um debate sobre desigualdades em termos de responsabilidade, mitigação e vulnerabilidade. Sob a alegação de um mundo mais complexo, onde a expressão ‘Terceiro Mundo’ é substituída pela noção de ‘Sul Global’, afirma-se que tal enquadramento de uma dívida Norte-Sul não seria mais pertinente, esvaziando o significado do tratamento diferenciado dos países em desenvolvimento. Porém, a persistência da dívida Norte-Sul em termos dinâmicos aponta que tal tratamento diferenciado dos países em desenvolvimento também continua atual. No intuito de instrumentalizar as obrigações da Convenção, o Protocolo de Quioto – endossado principalmente pelos países europeus – estabelece uma arquitetura descendente, apoiado em normas diferenciais por meio de compromissos de redução precisos, vinculantes e firmados internacionalmente, tendo como destinatários, em um primeiro momento, os países desenvolvidos. O Acordo de Paris – que reflete a estratégia dos Estados Unidos desde antes da própria Convenção – estabelece uma arquitetura ascendente, recorrendo a normas contextuais, onde os compromissos são nacionalmente determinados e isentos de um escrutínio internacional. O Acordo – cuidadosamente redigido – não estabelece nenhuma obrigação substancial precisa ou mesmo vinculante sobre tais contribuições, deixando ampla margem para todos os países e tornando a liderança dos países desenvolvidos no enfrentamento das mudanças climáticas apenas uma obrigação retórica. Deste modo, conclui-se que, sob o argumento de prover diferenciação para todos, o Acordo de Paris esvazia o significado do tratamento diferenciado dos países em desenvolvimento. Entretanto, apenas no âmbito da delegação, ou seja, dos mecanismos de cumprimento estabelecidos pelo Acordo, notadamente o balanço geral de implementação por meio de ‘naming and shaming’ que os países em desenvolvimento poderão exigir a necessária liderança dos países desenvolvidos. === In the 1970s, countries recognised as ‘developing’ began to be treated differently with regard to international agreements and doctrines that affected those countries development, following a widespread consensus among developing countries that the post-war order was unjust. As a result of political moves, developing countries have introduced such treatment in the framework of important international documents and multilateral agreements. The differentiated treatment of developing countries is expressed in international environmental law through the principle of common but differentiated responsibilities and respective capacities enshrined in the 1992 Rio Declaration on Environment and Development and culminated in the United Nations Framework Convention on Climate Change (UNFCCC). Having as its object the differentiated treatment of developing countries, limited to the central obligations under the UNFCCC, this research faces how international climate agreements operated within the differentiated treatment for developing countries. The research is based on the deductive method, a structuralist and historical materialist approach to the analysis of the content of legal texts, observing the differential treatment in obligations in terms of obligation, precision and delegation. The result was that climate change is necessarily a debate on inequalities in terms of responsibility, mitigation and vulnerability. Under the claim of a more complex world, where the expression 'Third World' is replaced by the notion of 'Global South', it is stated that such framing of a North-South divide would not be more relevant, depriving the meaning of differential treatment of developing countries. However, the persistence of the North-South divide in dynamic terms points out that such differentiated treatment of the developing countries is still relevant. In order to implement the obligations of the Convention, the Kyoto Protocol - endorsed mainly by European countries - establishes a downward architecture, supported by differential norms through precise, binding and internationally agreed reduction commitments, directed primarily to developed countries. The Paris Agreement - which reflects the US strategy prior to the Convention itself - establishes an upward architecture, using contextual norms where commitments are nationally determined and thus exempt from international scrutiny. The Agreement - carefully worded - does not establish any substantive or precise binding obligation on such contributions, leaving wide scope for all countries and does not require substantive efforts from developed countries in tackling climate change. In this way, it is concluded that, under the argument of providing differentiation for all, the Paris Agreement emptied the meaning of the differential treatment of developing countries. However, only within the scope of the delegation, through compliance mechanisms established by the Agreement, notably the global stocktake through naming and shaming that developing countries may require the necessary leadership of the developed countries.