Summary: | Resumo: Na Terra Indígena Apucarana, ou Apucaraninha como é usualmente chamada, de etnia kaingang, localizada ao norte do Estado do Paraná, houve, em 2011, a criação de uma nova aldeia, denominada Água Branca. Esta aldeia, diferentemente das outras três ali já existentes (Sede, Barreiro e Serrinha), pretendia uma autonomia política em relação ao cacique que representava a Terra Indígena como um todo. Esta ruptura, significativa no contexto kaingang, onde se defende a unidade político-territorial baseada atualmente na Terra Indígena, é tratada neste trabalho, a partir de narrativas sobre o fato bem como análise de suas consequências durante o período de trabalho de campo junto ao grupo. Trato aqui de três elementos chave que envolveram o processo de criação e a manutenção da diferenciação entre as aldeias: a "política interna", relativa à característica faccional dos kaingang e as articulações políticas e sociais relacionadas a ela; a moralidade, como elemento diretamente relacionado à chefia mas também às formas de convivência na comunidade, representadas através, principalmente, da "lei interna" ou "lei indígena" e sua relação com o que seria o tradicional; e a cultura, também relacionando a tradição, os conhecimentos e práticas e o próprio ser kaingang, a diferenciar-se dos brancos. Em um contexto vivido pelos moradores da Terra Indígena envolvendo uma indenização por uma antiga usina hidrelétrica na área, bem como a construção de uma nova usina em rio adjacente, com suas compensações então em negociação, analiso como o movimento de criação da nova aldeia, com símbolos, discursos e práticas relativas à moralidade e à cultura permitem articulações políticas e formas de sociabilidade que indicam a necessidade de um reforço da indianização, contra um possível tornar-se branco. Esta indianização, para além de ser contraposta ao branco, é, então, contraposta ao próprio outro indígena, representado na outra aldeia, favorecendo as transformações do ser indígena, do ser kaingang.
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