Pulmão do Cuspidor de Fogo

Apresenta-se o caso de um homem de 31 anos, fumador sem outras doenças conhecidas. É agente comercial numa empresa de produtos de higiene e, desde há 3 meses, iniciou a prática de cuspir fogo em espectáculos de rua. Recorre ao Serviço de Urgência (SU) por dor torácica anterior direita com caracterí...

Full description

Bibliographic Details
Main Authors: Rute M. Ferreira, J. Vasco Barreto
Format: Article
Language:English
Published: Sociedade Galega de Medicina Interna 2014-03-01
Series:Galicia Clínica
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Online Access:http://www.galiciaclinica.info/publicacion.asp?f=518
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1989-3922
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description Apresenta-se o caso de um homem de 31 anos, fumador sem outras doenças conhecidas. É agente comercial numa empresa de produtos de higiene e, desde há 3 meses, iniciou a prática de cuspir fogo em espectáculos de rua. Recorre ao Serviço de Urgência (SU) por dor torácica anterior direita com características pleuríticas, tosse seca e febre (40ºC), quadro que iniciou poucas horas após a aspiração do líquido “água de fogo” (composto por derivados do petróleo) durante uma performance a cuspir fogo. Do estudo realizado, apresentava aumento dos marcadores inflamatórios e hipotransparência do lobo médio na radiografia torácica, pelo que teve alta medicado com azitromicina 500mg uma vez dia. Por persistência e agravamento dos sintomas, recorre novamente ao SU 3 dias depois. Objectivadas febre e crepitações no 1/3 inferior do hemitórax direito. TAC torácica a mostrar consolidação do segmento anterior do lobo inferior esquerdo e do segmento medial do lobo médio (figuras 1 e 2), com áreas de baixa densidade (-77HU) - seta da figura 1-, áreas em vidro despolido no lobo médio (figura 2) e ainda algumas opacidades lineares nos segmentos basais dos lobos inferiores. Apresentava também aumento franco dos marcadores analíticos de inflamação, com leucocitose 16000/µL, neutrofilia e PCR 233 mg/L. A gasimetria arterial excluiu insuficiência respiratória. Assumiu-se Pneumonia Lipóide Exógena Aguda com possível sobreinfecção, pelo que iniciou amoxicilina-clavulanato após colheita de rastreio séptico. Realizou broncofibroscopia, que não revelou alterações da mucosa brônquica, e colheu lavado brônquico (LB), tendo-se observado células muco-secretoras, macrófagos alveolares e escassos polimorfonucleares. Não foi isolado agente infeccioso e apresentou evolução clínica e analítica favorável, tendo tido alta após 4 dias de internamento, a completar antibioterapia empírica em ambulatório. A Pneumonia Lipóide Exógena é uma entidade rara, que resulta da inalação e/ou aspiração de substâncias lipídicas, podendo ocorrer de forma crónica ou aguda, sendo esta última uma condição rara e consequente de aspiração acidental de uma grande quantidade de material lipídico num curto espaço de tempo.1 Os sintomas mais comuns são tosse, dor torácica, dispneia, febre e hemoptises, sendo habitual surgirem nas primeiras 12 horas após aspiração da substância.1 O melhor método de imagem para o diagnóstico é o TAC de alta resolução, que frequentemente mostra consolidação e/ou áreas em vidro despolido, habitualmente bilateral e nos lobos inferiores (quando unilateral o pulmão direito é o mais afectado), podendo ainda observar-se espessamentos septais interlobulares.2 O achado imagiológico mais característico é a presença de consolidação com áreas de baixa densidade (entre -150 a -30HU), fenómeno que se deve à atenuação da gordura1-4. O estudo citológico do lavado broncoalveolar pode evidenciar macrófagos xantomatosos, o que corrobora o dignóstico. Contudo, este achado não é específico e os falsos negativos são frequentes.1,3 O diagnóstico é baseado na histórica clínica e nos achados imagiológicos e citológicos, sendo que nenhum isoladamente faz o diagnóstico1. Dado ser uma entidade pouco frequente, com poucos casos descritos, o tratamento baseia-se na experiência clínica, sendo essencial: a evicção do agente causal; o tratamento de suporte e das complicações, nomeadamente sobreinfecção bacteriana. O uso de corticóides é controverso devendo ser reservado para as situação clínicas mais graves.1-2 No nosso caso não foi possível constatar os macrófagos típicos no LB. Atendendo à evolução favorável, pareceu-nos desnecessário expor o doente a métodos mais invasivos, até porque a história clínica e os achados imagiológicos característicos apoiam fortemente o diagnóstico. 1. Marchiori E, Zanetti G, Mano CM et al: Exogenous lipoid pneumonia. Clinical and radiological manifestations. Respir Med, 2011; 105(5): 659–66 2. Pielaszkiewicz-Wydra M. , Homola-Piekarska B. et al: Exogenous lipoid pneumonia – a case report of a fire-eater. Pol J radiol, 2012; 7(4):60-64. 3. Gondouin A, Manzoni P, Ranfaing E et al: Exogenous lipoid pneumonia: a retrospective multicentre study of 44 cases in France. Eur Respir J, 1996; 9: 1463–69 4. Betancourt SL, Martinez-Jimenez S, Rossi SE, Truong MT, Carrillo J, Erasmus JJ. Lipoid pneumonia: spectrum of clinical and radiologic manifestations. AJR Am J Roentgenol 2010; 194:103-9
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