Summary: | Em diversas de suas obras, Jean-Jacques Rousseau ressaltou a importância política dos componentes morais imprescindíveis a uma república bem ordenada, onde a virtude deveria estar presente em todos os cidadãos, a fim de que o interesse comum prevalecesse. No Discurso sobre as ciências e as artes, por exemplo, ao comparar sua época com os tempos em que os espartanos e os romanos deram grandes exemplos de patriotismo, o filósofo comentou que “os políticos antigos falavam sem cessar de costumes e de virtude; os nossos só falam de comércio e de dinheiro”, enfatizando assim uma diferença que demonstrava, em sua visão, o quanto a política havia se deteriorado ao longo dos séculos. Em contraposição a esse declínio, o pensador genebrino conferiu um lugar central aos costumes e à opinião pública, à religião civil e à educação para fomentar a união da comunidade e deliberações soberanas nas quais a vontade geral se expressasse claramente, em qualquer que seja o Estado republicano digno desse nome. Em nossa própria época, é digno de nota que o filósofo americano Michael J. Sandel tem produzido textos que denunciam o esvaziamento do espaço público de conteúdos morais e religiosos − segundo ele, uma consequência da proposta liberal de neutralidade frente às distintas concepções de bem dos cidadãos −, o que o autor entende ser nocivo às democracias contemporâneas, visto que leva ao empobrecimento das deliberações políticas. Para ele, é fundamental que tais conteúdos possam contribuir para promover as virtudes necessárias ao exercício da cidadania republicana, sem as quais as práticas do autogoverno seriam inviáveis. Diante disso, minha intenção é tomar as ideias de Rousseau e de Sandel como referência para discutir o lugar que a moral pode ocupar na política das repúblicas, sobretudo no contexto atual, não somente como um fator potencialmente positivo, mas também em termos de certos riscos que sua presença no espaço público é capaz de trazer.
|