O intelectual, o artista e as massas na cultura portuguesa finissecular

Durante o século XIX, as elites cultas europeias participaram amplamente das querelas e debates fomentados na e pela imprensa, não sendo possível fazer uma história da cultura contemporânea sem a pensar à luz da evolução do espaço público ao longo desse século e na sua transição para o século xx. C...

Full description

Bibliographic Details
Main Authors: Ana Teresa Peixinho, Luís Augusto Costa Dias
Format: Article
Language:Portuguese
Published: Coimbra University Press 2018-03-01
Series:Estudos do Século XX
Online Access:https://impactum-journals.uc.pt/estudossecxx/article/view/4699
Description
Summary:Durante o século XIX, as elites cultas europeias participaram amplamente das querelas e debates fomentados na e pela imprensa, não sendo possível fazer uma história da cultura contemporânea sem a pensar à luz da evolução do espaço público ao longo desse século e na sua transição para o século xx. Contudo, esta aliança entre o homem de letras e a imprensa – expediente característico da esfera pública oitocentista que, aliás, deu origem à designação de «publicista» na segunda metade do século, correspondendo a uma metamorfose do estatuto do «escritor público» do romantismo clássico – rapidamente começou a dar sintomas de rutura, à medida que aquela esfera sofria a influência da industrialização e massificação dos objetos culturais, processo iniciado nos Estados Unidos na segunda metade do século e cujo eco em França foi acompanhado de perto pela evolução histórica em Portugal. Foi neste contexto conjugado, a partir do último quartel do século xix português, de alteração do mercado dos bens culturais, de emergência de uma cultura urbana de massas e de crise das elites cultas, em especial no campo literário, que lentamente surgiu a figura do «artista» como alternativa à figura difusa do «homem de letras», espoletada na última década de oitocentos. Numa leitura de Fradique Mendes − meio personagem, meio autor, proto-heterónimo na ficção queirosiana − e sobre o fradiquismo como ideologia, destaca-se o seu valor simbólico, como derradeira tentativa de superação da morte do intelectual oitocentista através da afirmação do papel do artista. Dito de outro modo, Fradique Mendes constitui-se, num contexto de massificação emergente, como metáfora da crise do velho paradigma de intelectual do século xix que, perseguindo uma «aura perdida da cultura», oscila entre o silêncio de uma desistência, afinal pugnada pelo próprio Eça de Queirós que assim se revia como uma espécie de «cenobita», e a hipótese da figura do artista construir uma nova expressão da elite culta.
ISSN:1645-3530
1647-8622