Summary: | RESUMO Em Cabinda (noroeste de Angola), uma região do antigo Reino do Congo, existiu uma ancestral tradição gráfica observada em artefatos do cotidiano ou rituais que tem sido objeto de pesquisas em domínios multidisciplinares. O presente artigo remete para uma das possíveis reflexões em torno de uma tábua frustemente esculpida em alto-relevo, de que se desconhecem outros espécimes, e que integra a coleção recolhida pelos Missionários do Espírito Santo, atualmente em depósito no Museu da Ciência da Universidade de Coimbra. Não foi o valor estético que nos seduziu mas sim entender o seu significado, provocação que encontrou resposta na obra de José Martins Vaz, No mundo dos Cabindas, único suporte encontrado, até à data, que divulga a interpretação gráfica da peça e descodifica os motivos escultóricos. Esse objeto reflete um acordo de casamento e corporiza ideias, expressas por formas gravadas e símbolos, detentores de saberes tradicionais, intrinsecamente associados ao riquíssimo acervo da cultura material, incluindo a caixa nkobe-bingu, divindade protetora da família. Portadora de um significado singular, a tábua ou dístico de casamento espelha a dificuldade de acordo entre as famílias dos noivos quanto ao alambamento a negociar e sela o tradicional contrato de matrimónio dos Cabinda, etnia aparentada com o povo Kongo. Não sendo possível comparar com outras interpretações, o estudo desenvolvido permitirá compreender melhor o universo espiritual Cabinda refletido nas suas criações artísticas. Alargando horizontes de pesquisa, a tábua proporcionou um exercício museológico para o entendimento da realidade social da sua génese e de rituais de casamento de outros povos, em várias épocas.
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